A escrita do chão

Publicado em 11 Agosto 2014

Caso o leitor desconheça, Ronaldo Lucena é um homem de olhar sereno, feições comedidas e gestos estudados, tudo para esconder múltiplos talentos. Captura-nos com genuíno interesse e observa. Dialoga com nosso silêncio. Hipnotiza. Não deve ter sido por outro motivo que escolheu a radiologia para sustentar o médico que é: exercita seu talento ao ver e interpretar o que se passa por dento de cada um, tesouros enterrados e males ocultos. Ronaldo Lucena é, também, um escritor de palavras exatas, mensuradas numa balança de altíssima precisão e filtradas pelo bom gosto. Parece que voltou eternas vezes para cada uma das histórias do seu A escrita do chão e, a cada leitura, soube afinar e refinar a linguagem, deixando na página a solidez de um poema em prosa. Poucos conseguem isso com tamanha graça, com tanta riqueza. Faz o que se pode chamar de alta literatura. Nos 38 contos que compõem o livro, há espaço para a graça, para a sensualidade e para o espanto. Somos ouvintes de apelos desesperados na busca da vida e da morte, somos cúmplices de mansas traições – ou de fidelidade cruel? –, somos testemunhas de histórias encharcadas de humanidade. Somos, antes e acima de tudo, privilegiados observadores os quais olham o mundo pelas vistas de Ronaldo, numa hipnose consentida. Encantadora. Homem e natureza se irmanam nos relatos do autor. Há uma adesão profunda entre os personagens e a terra, a mesma que quase salta das páginas para escurecer a ponta de nossos dedos ou turvar nossa visão. Mas existe muito de etéreo, igualmente, ampliando a compreensão dos mais íntimos sentimentos. Experiente em antologias, publicado em revistas e seguro de sua voz, Ronaldo Lucena alcança ímpar maturidade em A escrita do chão. Ganha a literatura um valioso autor. Ganhamos nós um livro prodigioso.

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